domingo, 4 de agosto de 2013

O Teatro da Crueldade de Diamanda Galas


Artista: Diamanda Galas
Pais de Origem: Grécia/USA
Subgênero: Experimental / Avant Gard
Período de Atividade: 1982 / Atualmente

O olimpo da danação eterna e da melancolia irresgatável na história da música para mim estão plenamente encarnados em duas mulheres: Diamanda Galas e Nico. Uma pelo seu explicito malditismo poético, a outra por um senso de sofrimento tão sadomasoquista que acaba por torna-la um ser diabólico. Por hora vou me focar na Diamanda Galas, simplesmente porque estou com mais material a mão, porem num futuro não muito distante, teremos a Nico por protagonizando um artigo por aqui.

Poeta maldita, louca, bruxa, pervertida e uma inventiva compositora, dona de uma voz com alcance talvez apenas comparável a sua erudição literária, além de produtora, pianista, arranjadora e escritora e pintora isto é Diamanda Galas. Porem que é isso além de uma glacial e vaga definição técnica? Passemos a essência das ideias que são muito mais interessantes: Certa vez li num livro que aprecio muito “O Inquisidor” de um escritor italiano de nome Valério Evangelist uma passagem sobre o verídico Inquisidor Nicolas de Aymerich e o seu encontro numa floresta com uma jovem bruxa totalmente nua enquanto era sodomizada por um Incubo diabólico e sobre o fato o inquisidor relata que “eram tão altos e agudos os gritos da possuída, que seu clamor blasfemo podia facilmente ensurdecer todos a sua volta.”. Pois bem, séculos separam o Inquisidor Aymerich de Diamanda Galas, mas digo que se por algum sortilégio do destino pudesse ser colocado diante dela cantando ele apontaria para a mesma tomado de ira santa e diria: É ELA, É ELA!

E de fato é ela, a própria bruxa na floresta emitindo uivos infernais. Definir ela assim vale mais do que qualquer paragrafo louvando seus tecnicismos vocais ou sua já incontestável qualidade como musicista e arranjadora. Sua obra é um verdadeiro Grimoire versando sobre a dor, o desespero, a injustiça, a condenação, a culpa, a impotência, a incapacidade mental, a alienação, a indiferença esses sentimentos que ela parece conhecer tão bem e tão enraizados na alma humana que ela não pensa meia vez em nos condenar a morte com a sua música e talvez condenar a si mesma com sua blasfêmia, para que nós de frente com horror e o macabro expurguemos todos os nossos pecados! Assim sendo, ela não se torna apenas uma fodida experiência musical e artística se torna também uma experiência metafísica, uma verdadeira Teologia do Desespero. Nascida em San Diego, California, de pais gregos, a jovem Diamanda teve desde cedo uma rigorosa formação artística. Estudou desde muito cedo jazz, blues, musica erudita e canto lírico. A literatura gótica e toda a carga de maldição poética dos simbolistas franceses vieram para dar o toque final na personalidade de uma mulher esquisita em sua própria natureza. Talvez seja a ascendência grega, dona de traços fortes, rudes e cruéis, creio que o paganismo que era praticado na Grécia Antiga se adapta muito bem as ideias dessa sacerdotisa do ódio perdida no descaracterizado mundo moderno. Em 1979 sua performance operística no Festival de Avignon na França, lhe dava ingresso no mundo musical do qual ela não sairia depois disso.

Da sua discografia gostaria de citar os sensacionais álbuns da trilogia “The Mask of Red Death”. Esses três álbuns gravados entre 1986 e 1988 são o ápice da sua maturidade tanto musical quanto intelectual. A epidemia de AIDS que assolou o mundo nos anos 80 foi vista por muitos com pânico e horror, e Diamanda sofreu isso quase que na própria pele pois seu irmão era um ator de teatro chamado Philip-Dimitri Galás contraiu a doença. Os três álbuns são na verdade uma soberba alegoria para contextualizar de modo místico a epidemia e as analogias que ela fez a celebres epidemias do passado como a lepra e a peste negra são fantásticas somadas a sempiterna literatura maldita que esta presente de cara no próprio titulo da trilogia visto que “A Mascara da Morte Escarlate” vem de Edgar Allan Poe, um conto no qual o escritor versa sobre uma grande praga que afetou o condado de um príncipe. Sobraram também ao longo dos trabalhos citações a autores como Gerard de Nerval, Tristan Corbiere, e a sua impressionante leitura de um dos capítulos mais atrozes do Levitico hebraico que compõe parte do Antigo Testamento da Biblia o qual versa especialmente sobre o processo que um sacerdote deve tomar ao diagnosticar a praga de lepra em um doente. Em 1986, seu irmão morre devido à doença e Diamanda cria uma espécie de pensamento fatalista sobre o mundo: Estamos todos condenados! Tudo isto torna “The Divine Punishment”, “Saint of the Pit” ambos de 1986 e “You Must Be Certain of the Devil” (1988) álbuns tensos, sórdidos e difíceis de entender, mas ao mesmo tempo são uma das mais impressionantes aulas de música experimental e técnica vocal que qualquer um já viu na vida e por isso mesmo, indispensáveis. 










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